Convento de Jericó
Despimo-nos do corpóreo e do incorpóreo
Aqui, em terras ribatejanas
Onde em tempos frades capuchinhos se devotaram a S. Baco
Votos de pobreza, oração e trabalho respiram-se!
Ainda se sentem as suas pegadas diárias
Em busca da santidade desbotada no real das duas vidas
Chego e poiso o meu tripé
Tiro da mala o meu estojo
Escolho o meu melhor pincel
Começo pelo verde
É tão intenso e vivo que não posso resistir-lhe por muito tempo
Um manto verde cobre quase todo o chão
Apenas entrecortado pelos caminhos bejes da terra agora pisada e repisada por rodados de carros
Talvez em outros tempos se vissem cavalos, carroças e até mesmo os cajados dos frades
Galhos castanhos repousam nesse manto verde
E sobressaem florinhas amarelas de caule verde
Daquelas que em miúda chamava de "azedas" e que chupava às escondidas de todos!
A sensação do azedo arrepiava-me a pele!
O vento da-lhes de quando em vez e sente-se uma brisa suave que me faz ouvir a melodia
"Nas asas do vento que vem..."
Continuo pincelando no meu cenário natural
Árvores, muitas árvores povoam as margens do rio
Árvores de tronco principal grosso, disforme, e ramificado em raminhos fininhos e completamente nus
A sensação é que estarão secos mas a sua cor castanha escura e viva, afasta-a
Daqui onde coloquei a minha tela o rio faz uma saliência arredondada
Hoje há mais lodo viscoso, escuro, castanho do que água
Mas quero pintar água,
Água que cobre estas ilhas de terra e lodo que se vêem
E esta ausência da vida dos peixes
Visto deste ponto
O rio quase parece pequenos lagos que se tocam em margens de terra comuns
Margens que são amontoados de ramagens, de arbustros, de vegetação
Na sua maioria acastanhada
Em todos os castanhos que a minha palete de tintas consiga fabricar
Quando páro a avidez da pintura e me sereno
Pássaros aos pares, sozinhos ou em família vêm para mais perto
E oferecem-me o doce dos seus corpos
A luminosidade das suas penas
E a frescura dos seus cantares
Um deles, branco, grande, quiçá uma garça,
Fez um vôo bem rasteiro à água e abriu por completo as suas asas
Num misto de pertença e de liberdade
Buscando um rumo e deixando-se conduzir
O sol desceu
Afinal sempre vou pintar o pôr-do-sol
Como aquele que se reproduz numa das minhas memórias mais felizes
Jericó, a "Cidade das Palmeiras"
Quase que poderia ser aqui
Aqui, poderia ser o que se quisesse
Por isso, pinto o céu de azul claro, em mantos brancos que se adensam mais nuns lados do que noutros
E junto ao rio, a uma distancia simpática e apelativa
Vou fazer nascer uma casa de madeira
Com um alpendre grande e uma cadeira de baloiço
Para onde dão duas grandes janelas largas e a porta de entrada
Com um corrimão que sustenta pequenos vasos de amores perfeitos
E uma esteira suspensa com uma manta azul turquesa
Cheira a jasmim do chá quente acabado de fazer e posto na mesinha pequenina da rua
As bolachas de canela estão no frasco de vidro de tampa dourada
Sentamo-nos nas almofadas laranjas "pele de pêssego"
E lembro-me de pensar:
Aqui, em terras ribatejanas
Onde em tempos frades capuchinhos se devotaram a S. Baco
Votos de felicidade e amor em estado puro
respiram-se!
2 comentários:
Belo, simplesmente belo!
Abraço sim
pérola do oceano
sinto-te humedecer meu corpo, em cada abraço em que te aperto...
sinto-te dares-me a tua humidade e em simultâneo o teu calot...
deixo-me ficar neste abraço doce
prolongamos este abraço
e um sorriso envergonhado, mas de satisfação... se solta
e finalmente, reptio a palavra que permanentemente está á porta dos meus lábio:
AMO-TE
Abraço sim
No convento de Jericó
Onde a história se mistura com a lenda
Mas onde o passado está contido no presente
E onde a arte descritiva
Contém cor, mas também na ausência do silêncio ou na presença dele mesmo...
Onde a natureza salta de dentro para fora e de fora para dentro....
Obrigado...
Abraço sim...
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