sábado, 23 de outubro de 2010

Saíram sibiladas estas palavras...

Hoje um passarinho pousou na minha janela
esfregou os olhos
espreguiçou-se
inspirou o ar da manhã...
Tinha uma plumagem azulada
e os seus olhos eram de um esverdeado miscelâneo
Depois de susurrar ao Céu
Olhou para mim 
Abriu um sorriso rasgado 
e acenou-me docemente 
Da sua boca saíram sibiladas estas palavras:

"Foi um momento
O em que pousaste 
Sobre o meu braço,
Num movimento 
Mais de cansaço 
Que pensamento,
A tua mão
E a retiraste.
Senti ou não ?

Não sei. Mas lembro
E sinto ainda 
Qualquer memória
Fixa e corpórea 
Onde pousaste
A mão que teve
Qualquer sentido
Incompreendido.
Mas tão de leve !...

Tudo isto é nada,
Mas numa estrada 
Como é a vida 
Há muita coisa 
Incompreendida...

Sei eu se quando 
A tua mão
Senti pousando 
'Sobre o meu braço,
E um pouco, um pouco,
No coração,
Não houve um ritmo
Novo no espaço ?
Como se tu, 
Sem o querer,
Em mim tocasses
Para dizer
Qualquer mistério,
Súbito e etéreo,
Que nem soubesses
Que tinha ser.

Assim a brisa
Nos ramos diz
Sem o saber
Uma imprecisa 
Coisa feliz"

(Fernando Pessoa) 

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