segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Viagem...

Todos temos sonhos
Todos nos perdemos nos sonhos
Eu encontro-me num sonho
No sonho de me procurares aqui
No sonho de me encontrares aqui
No sonho de ser livre contigo aqui
Hoje
viajei até a esse sonho
Sei que apenas me conduziste
Mas um dia
Eu e tu seremos conduzidos
Eu e tu
seremos livres aqui
Eu e tu
sonharemos juntos aqui...

domingo, 2 de outubro de 2011

Sete cadernos pretos

"António desceu apressadamente as escadas para a sua cave. Cheirava à vela acesa da noite anterior. Entrou no seu gabinete e os seus sete cadernos pretos, tamanho A5, não estavam no mesmo lugar. Procurou-os em stress e lembrou-se de se concentrar no seu olfato. Tinha entornado um café em cima de um deles e no meio do nervosismo a grande mancha na capa nem sequer tinha tido uma tentativa de ser limpa. Os seus sete cadernos agoram eram seis mais um.
Sentou-se na sua cadeira de escritório e abriu a gaveta à sua frente por baixo do tampo da mesa. Tacteou apressadamente e sentiu uma espécie de gancho sobre uma superfície plana. O gancho castanho com a estrela azul celeste que prendeu os cabelos ruivos da Sara. Tinha-se esquecido que estava agora preso ao seu caderno de capa preta e interior branco pautado, contendo uma caligrafia apressada a verde. Os seus sete cadernos agora eram cinco mais dois.
Lembrou-se que a gaveta era funda e logo encontrou outro dos seus cadernos A5 apesar de a forma estar ligeiramente diferente. Puxou-o para si e sobressaía aquele marcador de livros com o malmequer na ponta que quando lhe foi oferecido lhe lembrou o cheiro campestre da casa dos seus avós na Guarda. Afinal aquele seu terceiro caderno, de conteúdo quadriculado e com fórmulas matemáticas, cuidadas e certinhas, que normalmente usava nos seus estudos de estatística, só podiam ter o tom preto e carregado que tem uma estatística.
Estava atrasado.
Levantou-se apressadamente com os três cadernos pretos debaixo do braço e ao virar-se, viu na estante branca sob parede laranja, dois dos seus cadernos. Estavam ligados por um clips grosso que também prendia os pedaços da carta rasgada do dia anterior. Gostava muito de poder aceitar o convite para aquele Baptizado mas já tinha passado a idade de ir a esse tipo de eventos só porque sim ou parecer bem.
Saiu do seu gabinete ainda de odor à vela do dia anterior, mas agora misturado com o cheiro do café e das flores do campo. Suavemente ouviu a melodia do "graças Senhor" que a Sara lhe tocou no dia anterior. Foi até ao seu piano e lá estava o seu caderno preto de interior musical e com a pauta que ela tinha composto...
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Respirou o compasso daquelas páginas brancas pingadas de notas vestindo preto.
Enibriou-se dos dedos delgados e compridos que suavemente beijaram as teclas do seu piano.
Frenéticamente se enganchou nos traços e nas rugas daquele rosto moreno que o chamou. E na doce alfazema da lonjura do vestido de Sara.
O pulsar ferido do seu coração foi teclando, então, a acalmia das manhãs outonais no lago."
Sofia MM